Em um país de dimensões continentais e com um agronegócio intenso como o Brasil, é natural
que muitas empresas visem este mercado e, consequentemente, a aquisição de imóveis rurais.
Evidente que, por se tratar de um setor econômico estratégico, a participação de estrangeiros
no agronegócio através da aquisição de imóveis é regulada e limitada por lei, mais
especificamente, através da Lei Federal 5.709/71 e de sua regulamentação pelo Decreto
74.965/74.
Segundo estas normas, as aquisições de imóveis rurais por empresas estrangeiras estão
limitadas, dentre outras, pelas dimensões do imóvel negociado, nacionalidade dos adquirentes,
localização e destinação específica do imóvel, bem como dependem de aprovações de órgãos
públicos federais, além de estarem obrigadas a serem formalizadas por escritura pública.
No entanto, quando estas empresas são brasileiras (possuem sede e administração no Brasil),
mas têm a maior parte do seu capital social controlado por estrangeiros, surge a dúvida sobre
qual o tratamento legal seria aplicado na aquisição de imóveis rurais.
Afinal, estas empresas teriam o seu direito de aquisição limitado, tal qual as pessoas
estrangeiras (Lei Federal 5.709/71), ou poderiam atuar neste setor sem limitações, como
pessoas nacionais?
A resposta para este questionamento é um tanto quanto controversa.
O § 1º do artigo 1º da Lei 5.709/71 estabeleceu que a "empresa brasileira sob controle
estrangeiro" está sujeita às mesmas regras aplicadas às empresas estrangeiras. Porém, com o
advento da Constituição Federal de 1988, o referido dispositivo não fora recepcionado, na
medida em que o artigo 171 previa a distinção de tratamentos entre as empresas brasileiras de
capital nacional e aquelas de capital estrangeiro, apenas para a concessão de benefícios e não
para a restrição de direitos.
A revogação tácita do §1º do artigo 1º da Lei 5.709/71 foi posteriormente mantida pela AGU
(Advocacia Geral da União) através dos Pareceres GQ-22/1992 e GQ-181/1997, mesmo com a
revogação expressa do artigo 171 pela Emenda Constitucional nº 06 /95.
Já em novo reexame da questão, através do Parecer nº LA-01 (publicado em 23/08/2010), a
AGU mudou seu entendimento, passando a defender a tese de que o §1º do artigo 1º da Lei
5.709/71 continuaria válido, eis que recepcionado pela Constituição Federal de 1988 ainda em
seu texto original, vinculando toda a Administração Federal.
Diante disto, podemos concluir que, atualmente, caso uma empresa brasileira sob controle
estrangeiro busque a aquisição de um imóvel rural no Brasil, terá de observar as condições
restritivas da Lei 5.709/71, ou não conseguirá obter o registro da aquisição nos Cartórios de
Imóveis, visto a orientação recebida por estes em seguir o entendimento do Parecer LA-01 da
AGU, sendo a única alternativa, apesar de não garantida, o recurso ao judiciário através de
mandado de segurança.
Todavia, duas ações sobre o tema estão em trâmite no STF e aguardam decisão definitiva
conjunta: a ADPF 342 (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental 324) movida pela
SRB (Sociedade Rural Brasileira) e a ACO 2.463 (Ação Civil Originária 2.463), movida pela
União e pelo INCRA.
O julgamento destas ações poderá alterar o cenário das aquisições de imóveis rurais no Brasil
caso haja decisão do STF que reconheça a não recepção do §1º do artigo 1º da Lei 5.709/71
pela Constituição Federal de 1988 e, assim, elimine as distinções negativas entre as empresas
brasileiras sob controle nacional e sob controle estrangeiro.
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disposição para discutir quaisquer questões a ele relativas.